10 de março de 2013

A vida é estranha I

Primeiro foi o Arthur, dizem que ele mudou a vida dela.

Arthur era um mineiro viajante descobridor de todos os pedaços e sentimentos do mundo. Tinha uma personalidade forte, tomava decisões rápidas sem muitas voltas e defendia que a sinceridade é sempre necessária. Seus bolsos eram cheios de rimas rabiscadas em guardanapos sobre todo mundo a ir atrás da sua própria liberdade. Lá no fundo e por trás de todas as risadas, Arthur era um pouco triste e profundo, mas ao mesmo tempo era mais vivo que todo mundo. Suas histórias do passado são densas o suficiente para ensinar que as coisas simples são as que contam, principalmente por causa dos momentos em que sofreu a  ausência delas. Tem gente que precisa sentir falta das coisas simples da vida pra perceber o quanto elas importam. Foi assim com Arthur e é assim com todo mundo. Leva-se um tempo para descobrir a hora certa de se viver as coisas e o que é importante nelas.

Bella era a paulista sorridente das fotografias, La Bella principessa tinha uma criatividade única na hora de preparar as próprias fotos. Tem aquele retrato das pernas mostrando uma parte da lingerie cor vinho, o beijo na rosa champagne evidenciando as unhas vermelhas e aqueles balões coloridos voando no céu fazendo a gente acreditar que ainda dá tempo de voltar a ser criança. A Bella, na verdade, era sempre muito sutil. Usava a fotografia para criar dúvidas e deixava o retrato sempre aberto para várias interpretações, porque queria esconder a sua nudez emocional. Acho sim que ela sonhava. Durante muito tempo, la Bella Principessa mergulhou nas relações até mesmo para parar de sonhar. Mas, se machucou bastante e passou a acreditar que o mundo não sabe lidar com emoções.

Os dois se cruzaram quando Arthur subiu no palco no meio da festa e tentou provar pra todo mundo o quanto a vida pode valer a pena quando você suga ela com todas as forças. Olhava diretamente nos olhos de Bella e não cansava de repetir "É bom viver pessoal, a gente tem que ser fiel ao que sente e ao que o destino coloca bem na nossa frente. Vai lá se jogar, não tem problema algum errar. Sentir dor faz parte do caminho e melhora quando gente continua seguindo. Experiências ruins existem desde que o mundo é mundo, e todo mundo precisa aprender a se libertar de todas as amarras e os medos que elas dão. Você tem que viver de verdade, viver realmente... entende?".


É claro que ele estava dando em cima dela, Arthur era um tremendo galanteador. Eu poderia chamá-lo de "galinha" se eu colocasse o pé no universo feminino, afinal ele coleciona casos amorosos e a maioria não tem um final benéfico para o lado mais frágil da relação. Mas, eu também poderia chamá-lo de filho da puta conquistador se eu colocasse o pé no mundo masculino, porque ele sempre consegue as melhores mulheres da festa e dos outros, deixando qualquer um sem entender o que esse conquistador filho da puta tem.

Há uma teoria de que "galinhas" colecionam mulheres apenas para satisfazer a própria sede e não se interessam nunca mais por elas, já os conquistadores são apaixonados pelos trejeitos femininos e tudo o que eles podem oferecer. Os galanteadores querem conhecer o gosto, saber se o perfume é o doce ou o forte, se bebe cerveja ou fica só no saquê, se tem a boa conversa ou só fala bobagem, se finge gostar de futebol pra agradar ou se vai atrapalhar os jogos do domingo. Essa teoria defende a ideia de que os "galinhas" vão embora, enquanto os galanteadores ficam por um tempo para conhecer melhor.

Colocando o pé no mundo masculino e no feminino, eu digo que todo mundo tem uma fase "galinha". Eu digo que "galinhas" podem se apaixonar e que conquistadores podem ter o coração partido e entrar na fase de não querer ter sentimentos fortes, porque às vezes eles só complicam as coisas. Eu digo que todo mundo é frágil, mulher ou homem. Eu digo que todos somos românticos e sonhadores, a diferença é que em algum momento o mundo te estraga. Ou te conserta, sei lá. Sendo "galinha" ou "conquistador filho da puta", não importa. No final das contas, você não vai precisar colocar rótulo algum na pessoa que quiser fazer a diferença na sua vida.

Bella não sabia se algum cara havia feito diferença em sua vida. Quer dizer... ela sempre deu tanta importância para os sentimentos que todos os caras a marcaram de alguma forma. Tinha histórias que qualquer mulher aos 23 anos poderia ter, mas eu não sei se qualquer mulher de 23 anos foi tão estupidamente legal com todos os homens de sua vida. E quando falo estupidamente legal, estou mencionando o fato de que Bella sempre se apaixonou e quis ser incrível até mesmo antes da pessoa mostrar que merece... e isso acaba sendo estupidamente legal. Só que agora as coisas estavam diferentes, Bella estava cansada de todos esses casos amorosos desconsertantes, com finais estranhos e desculpas aceitas com reações estupidamente legais. Acho que ela era meio sozinha e um tanto carente, os paulistas são assim. Na volta pra casa, pensou que aquele cara havia dito coisas importantes mesmo estando bêbado. Sentiu que talvez ele pudesse ser a sua história bonita, mas também poderia ser só mais uma delas. Em todo o caso, já não havia mais clima para escolher qualquer uma das opções. Bella não queria cansaços ou ter que lidar com joguinhos. Abdicou da ideia de imaginar enredos, mesmo com o cara bêbado parecendo o personagem perfeito para uma história bonita e pronta para ser eternizada em fotos criativas que ela mesma produziria. Não seria mais fácil se a gente olhasse nos olhos de alguém e já soubesse se vai sofrer ou não?

Descobri que a vida é estranha, mas pode valer a pena.


Continua...
Letícia Cardoso

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